A filosofia grega, que é a própria filosofia em
si, entendida como aspiração ao conhecimento racional, lógico e sistemático da
realidade natural e humana, da origem e causas do mundo e de suas
transformações, da origem e causas das ações humanas e do próprio pensamento, é
um fato tipicamente grego.
Evidentemente, isso não quer dizer, de modo algum
que outros povos, tão antigos quanto os gregos, como os chineses, o hindus, os
japoneses, os árabes, os persas, os hebreus, os africanos ou os índios da
América, não possuam sabedoria, pois possuíam e possuem. Não quer dizer que
todos esses povos não tivessem desenvolvido o pensar e as formas de
conhecimento da Natureza e dos seres humanos, pois desenvolveram e desenvolvem.
Os chineses desenvolveram um pensamento muito
profundo sobre a existência de coisas, seres e ações contrarias ou opostos, que
formam a realidade. Deram ás oposições o nome de dois princípios: Yin e Yang.
Yin é o principio feminino passivo na Natureza, representado pela escuridão, o
frio e a umidade; Yang é o principio masculino ativo na Natureza, representado
pela luz, o calor e o seco. Os dois princípios se combinam e formam todas as
coisas, por isso, são feitas de contrários ou de oposições. O mundo, portanto,
é feito da atividade masculina e da passividade feminina.
Já
na filosofia grega, por exemplo, o próprio Pitágoras. Ele diz que a Natureza é
feita de um sistema de relações ou de proporções matemáticas produzidas a
partir da unidade (o numero um e o ponto), da oposição entre os números pares e
impares, e da combinação entre as superfícies e os volumes (as figuras
geométricas), de tal modo que essas proporções e combinações aparecem para
nossos órgãos dos sentidos sob a forma de qualidades contrarias: quente-frio,
grande-pequeno, seco-úmido, áspero-liso, claro-escuro, duro-mole, etc.
Segundo
Pitágoras, o pensamento alcança a realidade em sua estrutura matemática
enquanto nossos sentidos ou nossa percepção alcançam o modo como à estrutura
matemática da Natureza aparece para nós, Istoé, sob a forma de qualidades
opostas.
A
filosofia é um modo de pensar e exprimir os pensamentos que surgiu especificamente
com os gregos e que, por razoes históricas e políticas, tornou-se, depois, o
modo de pensar e de se exprimir predominante da chamada cultura européia
ocidental, da qual, em decorrência da colonização portuguesa do Brasil, nós
também participamos.
Através
da filosofia, os gregos instituíram para o Ocidente europeu as bases e os
princípios fundamentais do que chamamos de razão, racionalidade, ciência,
ética, política, técnica, arte. Alias, basta observarmos que palavras como
lógica, técnica, ética, política, monarquia, anarquia, democracia, física,
zoológico, farmácia, entre muitas outras, são palavras gregas, para percebemos
a influencia decisiva e predominante da filosofia grega sobre a formação do
pensamento e das instituições das sociedades européias ocidentais.
O legado da filosofia grega para o
ocidente europeu
Por
causa da colonização européia das Américas, nós também fazemos parte – ainda
que de modo inferiorizado e colonizado – do Ocidente europeu e assim também
somos herdeiros do legado que a filosofia grega deixou para pensamento
ocidental europeu.
Desse
legado, podemos destacar como principais contribuições as seguintes:
•
A idéia de que a Natureza opera obedecendo a leis e princípios necessários e
universais, isto é, os mesmos em toda parte e em todos os tempos. A lei da
gravitação afirma que todo corpo, quando sofre a ação de um outro, produz uma
reação igual e contraria que pode ser calculada usando elementos do calculo a
massa do corpo afetado, a velocidade e o tempo com que à ação e a reação se
deram. Essa lei é necessária, isto é, nenhum corpo do Universo escapa dela e
pode funcionar de outra maneira que não desta; e esta lei é universal, isto é,
é valida por todos os corpos em todos os tempos e lugares.
•
A idéia de que as leis necessárias e universais da Natureza podem ser
plenamente conhecidas pelo nosso pensamento, isto é, não são conhecimentos
misteriosos e secretos, que precisariam ser revelados por divindades, mas são
conhecimentos que o pensamento humano, por sua própria força e capacidade, pode
alcançar.
•
A idéia de que nosso pensamento também opera obedecendo a leis, regras e normas
universais e necessárias, segundo as quais podemos distinguir o verdadeiro do
falso.
•
A idéia de que as praticas humanas, isto é, a ação moral, a política, as
técnicas e as artes dependem da vontade livre, da deliberação e da discussão,
da nossa escolha passional (ou emocional) ou racional, de nossas preferências,
segundo certos valores e padrões, que foram estabelecidos pelos próprios seres
humanos e não por imposições misteriosas e incompreensíveis, que lhes teriam
sido feitas por forças secretas, invisíveis, sejam elas divinas ou naturais, e
impossíveis de serem conhecidas.
•
A idéia de que os acontecimentos naturais e humanos são necessários, porque
obedecem a leis naturais ou da natureza humana, mas também podem ser
contingentes ou acidentais, quando dependem das escolhas e deliberações dos
homens, em condições determinadas.
Um
dos legados mais importantes da filosofia grega é, portanto, essa diferença
entre o necessário e o contingente, pois ela nos permite evitar o fatalismo –
“tudo é necessário, temos que nos conformar e nos resignar” –, mas também
evitar a ilusão de que podemos tudo quanto quisermos, se alguma força extra
natural ou sobrenatural nos ajudar, pois a Natureza segue leis necessárias que
podemos conhecer e nem tudo é possível, por mais que o queiramos.
•
A idéia de que os seres humanos, por Natureza, aspiram ao conhecimento
verdadeiro, á felicidade, á justiça, Istoé, que os seres humanos não vivem nem
agem cegamente, mas criam valores pelos quais dão sentido ás suas vidas e ás
suas ações.
A
filosofia surge, portanto, quando alguns gregos, admirados e espantados com a
realidade, insatisfeitos com as explicações que a tradição lhes dera, começaram
a fazer perguntas e buscar respostas para elas, demonstrando que o mundo e os
seres humanos, os acontecimentos e as ações humanas podem ser conhecidos pela
razão humana, e que a própria razão é capaz de conhecer-se a si mesma.
Em suma, a filosofia grega surge quando se
descobriu que a verdade do mundo e dos humanos não era algo secreto e
misterioso, que precisasse ser revelado por divindades a alguns escolhidos, mas
que, ao contrario, podia ser conhecida por todos, através da razão, que é a
mesma em todos; quando se descobriu que tal conhecimento depende do uso correto
da razão ou do pensamento e que, alem de a verdade poder ser conhecida por
todos, podia, pelo mesmo motivo, ser ensinada ou transmitida.
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