Eu sempre fui uma pessoa tímida e de poucos amigos. Se você
procurasse a turminha da bagunça na escola, não me encontraria nela. Sempre
preferi o segundo plano; o lugar da observação e, não, da fala.
Toda essa timidez fez de mim uma pessoa, digamos, insegura.
Na busca por valor e afirmação, tomei uma rota que me parecia óbvia: já que não
tenho a desenvoltura dos que se atiram aos esportes, a graciosidade das meninas
que dançam e a extroversão dos mais sanguíneos, vou conquistar o meu espaço
sendo uma pessoa inteligente. O único problema é que esse raciocínio me custou
caro, amigo(a). Muito caro.
Não. Não é que eu não gostasse de estudar e me forçasse a
isso. Veja bem, eu sempre fui mais introspectiva; amiga dos livros e do
silêncio. Esforçar-me na escola não era nenhum sacrifício para mim – apenas um
caminho “natural” e que, logo de início, provou ser bastante recompensador. Já
na primeira série, quando eu tinha lá meus oito anos, já era a primeira aluna
da classe. Mais tarde, aos dez anos, tive um problema de saúde que me afastou
da escola por alguns meses. Esporadicamente, ia ao colégio para fazer alguma
prova ou entregar algum trabalho. Sabe o que acontecia? Eu entrava na sala, e
meus colegas batiam palmas para mim. NÃO ESTOU INVENTANDO. Isso acontecia vez
após vez.
Dá para imaginar a mega-massagem que isso fazia no meu ego?
Eu era uma pré-adolescente imbatível na escola. Dona das melhores ideias; das
notas mais altas; dos melhores textos – e até mesmo dos melhores desenhos
(pasme!)
As coisas não mudaram muito daí pra frente. Em todas as
escolas por onde passei era a mesma coisa. Não, as palmas foram uma
particularidade do meu quarto ano de colégio e, graças a Deus, os
colegas dos tempos de adolescência não tiveram a mesma ideia. Mas as notas continuaram
lá em cima. Em todas as matérias – menos educação física (rs). Elas eram como
que o meu passaporte para a “inclusão social”.
Quando cheguei à faculdade, já com 21 anos, a situação mudou
um pouco. Não tinha mais o mesmo tempo para estudar, já que eu também
trabalhava. Apesar disso, minhas notas semestrais jamais foram inferiores a 80.
Eu era boa naquilo que fazia. Muito boa.
Mas aí veio o mestrado e, com ele, as melhores coisas que
Deus poderia fazer por esta pobre alma. Havia estruturas muito arraigadas na
minha vida que precisavam urgentemente ser quebradas. Só Deus podia fazer
isso, e
Ele escolheu justamente o cenário acadêmico para começar a golpeá-las.
Já no primeiro semestre, enfrentei uma situação terrível com
dois professores. Não vou entrar nos pormenores, mas registro que me senti
humilhada e incompreendida. Ainda naquele semestre, comecei a ter muita
dificuldade de permanecer dentro da sala de aula durante as aulas. Meu nível de
ansiedade estava nas alturas. Sentia que os professores iriam me atacar com
perguntas para as quais eu não teria respostas. Sentia-me ameaçada pelos meus
colegas. O simples fato de estar no ambiente da faculdade era suficiente para
disparar uma crise ansiosa em mim. Eu tinha vontade de sair correndo. Chegava
ao final do dia me sentindo exausta, como se um caminhão tivesse passado por
cima de mim. Logo eu, que sempre adorei o ambiente escolar.
As provas eram um capítulo à parte. A situação chegou ao
ponto de eu precisar pedir para fazer as provas em outra sala, sozinha, porque
não conseguia me concentrar em ambientes coletivos. Graças a Deus, contei com a
boa compreensão de alguns professores nesse momento. Mas lembro-me de uma
professora que respondeu, com grosseria e rispidez, ao meu pedido: “De maneira
alguma. Você precisa aprender a controlar suas emoções.” Que Deus a ajude a
encontrar o caminho da misericórdia.
Aquele turbulento semestre chegou ao fim, mas as
turbulências internas só pareciam aumentar. A gota d’água foi o dia em que
trombei no corredor com um dos professores com quem tivera problemas ao longo
do semestre. O simples fato de vê-lo ali foi suficiente para disparar uma crise
de pânico em mim. Saí correndo do prédio da escola, entrei no carro e fui pra
casa. Ao chegar, falei com meus pais, em meio a lágrimas: “Não aguento mais.
Preciso ir a um psicólogo. Não estou normal.”
E foi assim que a Micheline entrou na minha vida. Os
processos ansiosos que eu vinha vivendo estavam tão graves, que as
consequências físicas eram visíveis. Eu pesava 41,8 quilos naquela época.
Qualquer ajuntamento social era uma cruz para mim. Era difícil ficar em
ambientes fechados. Nem na igreja eu conseguia ficar sem que sentisse uma
pontinha de ansiedade. Ao lado da psicóloga, caminhei por várias vias da minha
vida que precisavam de reparos urgentes. Foi um momento de reconhecer
fraquezas, de entender que eu não era nenhuma Brastemp e, principalmente, de
encontrar a verdadeira vereda da dependência de Deus. Àquela altura, eu pensava
seriamente em abandonar o mestrado, como uma forma de colocar um fim a todo
aquele sofrimento. Só não o fiz porque a Micheline não deixou. Ela enxergava o
processo como uma conquista e me dizia, vez após vez, que não abandonasse os
meus sonhos.
Sim, precisei de ir ao psiquiatra e precisei de medicação.
Se fui resistente? Oh, se fui. Achava que tomar remédio era recurso para os
fracos. Tinha lá meus preconceitos. Admitir as nossas fraquezas nunca é fácil.
Para o crente, então, é mais difícil ainda, porque parece que não estamos
confiando em Deus ou na cura que Ele pode nos dar. Precisei processar muitas
coisas, rever muitos conceitos, abrir-me para a graça de Deus, que é suficiente
e vem na hora em que precisamos dela – não antes.
Com a síndrome do pânico, Deus me jogou no chão. Enxerguei
que eu não era nada daquilo que pensava ser. Não era autossuficente, não era
infalível e, por mais que estudasse, dependia do Senhor até para fazer minhas
provas. Caminhei por aquele período dando um passo de cada vez, sempre apoiada
na mão divina. Às vezes, tropeçava e caía. Às vezes, vencia pequenos obstáculos
e me sentia mais forte. Foi duro, leitor. Muito duro. Nem sempre entendia os
motivos ou propósitos de Deus, e nessas horas, era preciso confiar dobrado.
A pesquisa que desenvolvi no mestrado e a minha dissertação
são um capítulo à parte. Eu não me sentia nem um pouco capaz de levá-las a
termo. Eu via os obstáculos, e eles me pareciam enormes. Eu cheguei a contar
aqui sobre como meu projeto de pesquisa foi gerado e, portanto, não vou me
repetir. Mas acho que preciso reafirmar que até hoje, quando olho para o que
produzi, não me orgulho dos meus feitos, porque sei, verdadeiramente, que tudo
o que está ali veio de Deus para mim e que as ideias são dele, não minhas.
Hoje, querido leitor, eu encaro minhas tarefas diárias por
um ângulo totalmente diverso daquele de anos atrás. Sejam os exercícios
fotográficos, sejam as tarefas da minha casa, eu sempre peço a Deus que me
conduza. Ontem mesmo, comentava com minha mãe sobre isso. Quando vou fotografar
alguém ou algum evento, sempre peço ao Senhor que me instrua acerca do uso da
luz, dos melhores ângulos e das regulagens que devo fazer em meu equipamento.
Costumo dizer que Deus é meu diretor de cena – aquele que me faz enxergar as
imagens mais belas, que me mostra alternativas que meus olhos não conseguem
ver. Nada mal depender daquele que é o Criador por excelência; a fonte de toda
originalidade e sabedoria.
Alguém poderia se perguntar por que estou expondo todos
esses detalhes da minha vida. Eu respondo. É porque não aguento mais ver a
autossuficiência de tantos crentes. Vez por outra, topo com pessoas que agem
como se Deus estivesse pegando o boi por elas serem suas seguidoras. Não,
gente. É nós que somos alvo da graça de Deus. Foi ele que nos amou primeiro. São
as nossas justiças que, aos olhos de Deus, são como trapos de imundícia. Não
vamos inverter essas coisas, pelamordedeus. O caminho da dependência é difícil
de ser trilhado porque algumas vezes ele implicará certos golpes no nosso ego.
Enxergar nossas fraquezas não é um processo muito simples. Todavia, ele é
necessário porque nos permite encaminhar ao trono, com atitude pura e genuína,
os louvores que recebemos. Isso porque reconhecemos, com coração sincero diante
de Deus, que ele é a nossa fonte e que sem a presença dele em nossos caminhos,
não somos nada.
Hoje a minha oração é para que a igreja encontre esse
caminho, e para que aqueles que já o encontraram não se desviem dele.